A diferença brutal entre estar vivo e estar morto. E percebemos, então, como numa epifania tardia, o verdadeiro significado daquelas palavras: "ser ou não ser, eis a questão". É possível que sejamos apenas pó? Onde está, naquelas linhas rígidas, o génio, a vida que foi um dia? É possível que tenha sido apenas um truque de ilusionismo? Se eu escrevo agora, é possível que sejam apenas impulsos nervosos, sangue que, bombeado pelo coração, irriga os neurónios activos? É possível que eu seja, e tu sejas, apenas mecânica? Onde está a vida insuflada? Não há expressão na boca descaída. As pálpebras fechadas não dizem nada. O corpo mirra como se a vida fosse qualquer coisa física que se perdeu, como um braço a mais, um bocado de carne.
Somos e depois não somos. Ninguém sabe dizer o momento. Mas a diferença abissal. Somos nós? Como podemos ser nós? Quando deixamos de ser, parece tudo tão surreal. Será que, quando deixamos de ser, alguma vez existimos, alguma vez fomos? Como é possível termos existido se agora não somos?